A ausência de resiliência e a infantilização profissional
Há pouco tempo atrás, li uma manifestação do Drº Drauzio Varella, sobre seus hábitos, a prática esportiva e o comportamento de seus pacientes quando são instados a mudar seu estilo de vida e achei muito interessante, vejamos:
“Eu corro porque estou convencido de que o exercício físico é contra a natureza humana. Precisamos combater essa inércia. Nenhum animal desperdiça energia, ele gasta sua força para ir atrás de comida e de sexo ou para fugir de um predador. Com essas três necessidades satisfeitas, ele deita e fica quieto. Vá a um zoológico para ver se você encontra uma onça correndo à toa. Ou um gorila se exercitando na barra. Por isso é tão difícil para a maioria das pessoas fazer atividades físicas.
Um exemplo disso são meus pacientes. A grande maioria são mulheres com câncer de mama. Muitas passam por quimioterapia, perdem o cabelo, têm enjoos, fazem cirurgia para retirar parte do seio. E enfrentam esse processo com tanta coragem que fico até emocionado.
Depois disso tudo, falo para elas que, se caminharem 40 minutos por dia, cortam pela metade a chance de morrer de câncer de mama. Esse índice é maior do que o da quimio, mas menos de 1% das minhas pacientes começam a fazer exercício. Vai contra a natureza humana.
Muita gente fala que não tem tempo de fazer exercícios. Dizem que acordam muito cedo para levar os filhos à escola, que trabalham demais, que têm que cuidar da casa. Antes eu até ficava com compaixão, mas hoje eu digo: isso é problema seu. Ninguém vai resolver esse problema para você.
Você acha que eu tenho vontade de levantar cedo para correr? Não tenho, mas encaro como um trabalho. Se seu chefe disser que a empresa vai começar um projeto novo e precisa que você esteja lá às 5h30, você vai estar lá. Você vai se virar, mudar sua rotina e dar um jeito. Por que com exercício não pode ser assim?
Nós temos a tendência de jogar a responsabilidade sobre a nossa saúde nos outros. Em Deus, na cidade, na poluição, no trânsito, no estresse. Cada um de nós tem que se responsabilizar pelo próprio bem-estar e encontrar tempo para cuidar do corpo. É uma questão de prioridades.
Se você não consegue fazer exercício de jeito nenhum, pelo menos tem que ter consciência de que está vivendo errado, que não está levando em consideração a coisa mais importante que você tem, que é o seu corpo.”
E assim, conforme o relato do Drº Drauzio Varella, há aqueles que, como ele, perseveram para obter um resultado e outros que preferem buscar um caminho mais fácil ou terceirizar problemas, buscando desculpas ou uma solução milagrosa.
No mundo corporativo não é diferente.
Por muito tempo, gerações acreditaram que estabilidade profissional estava vinculada aos longos anos que se passava trabalhando na mesma empresa.
Era comum o patriarca da família iniciar sua vida profissional com determinado empregador, até que se aposentasse e, posteriormente, as próximas gerações viessem a exercer algum tipo de função na mesma empresa.
Os recrutadores apreciavam pessoas que passavam anos trabalhando em um único lugar, pois eram consideradas confiáveis, estáveis e dedicadas.
Nesse período os tempos difíceis não permitiam sucumbir, haviam poucos benefícios legais, inexistência de vale refeição, vale transporte, participação nos lucros, as pessoas resistiam bravamente às jornadas laborais extenuantes.
Essas gerações superaram crises, planos econômicos desgastantes, experimentais e sobreviveram a diversas intempéries, que lhes condicionaram a resistir com poucos recursos, criatividade, resiliência e perseverança, eram felizes dentro do que o mundo lhes oferecia, em meados dos anos 70, 80, descobertas eram realizadas sem auxílio de computadores, Google, teorias, terapias e hipóteses.
E tudo evoluiu, logo surgiram gerações que buscavam soluções fáceis, relações humanas sem aprofundamento, conhecimentos superficiais.
Aquele profissional que permaneceu muito tempo na mesma empresa passou a ser considerado acomodado, surgiram Doutores, Mestres com estudos pautados em escritores populares, definições da Wikipédia, desprezando-se grandes e renomados profissionais mais antigos.
Facilidades foram criadas, benefícios surgiram e, derradeiramente, as gerações seguintes deixaram de questionar e passaram a aceitar tudo que lhes era apresentado.
As crianças se transformaram em adultos impacientes e indolentes, a tal geração “Y”, que passou a semear mas sem esperar a colheita, almejando sair da universidade e, no primeiro ano de trabalho, tornar-se CEO.
Com o surgimento dessa nova geração, também encontraram definição para o bulling, cyberbulling, assédio moral, síndrome do pânico, hiperatividade, dislexia e todas classificações para males que até então as pessoas sequer sabiam que tinham ou cometiam.
E para cura dos males, começaram a utilizar Prozac, Ritalina ou simplesmente pedir demissão, ou seja, adultos em busca de muletas ou mecanismos de fuga.
Enquanto isso, também vieram as convicções de que tudo feito no passado não servia mais, devendo ser reformulado, os profissionais com experiência receberam rótulos e foram estigmatizados como desatualizados e decadentes.
As empresas passaram a investir em mão de obra jovem, esperando a reinvenção da roda, boas idéias realmente surgiram, mas com elas vieram a terceirização de problemas, a falta de comprometimento que outrora era identificado nos profissionais seniores.
As universidades e as empresas ficaram apinhadas de adultos presos em uma eterna infância, incapazes de assumirem responsabilidades e as consequências de seus atos, capazes apenas de reivindicar bônus sem ônus, desvalorizando tudo que lhes é incompreensível ou que esteja em desacordo com seus anseios pessoais.
Vejo meus colegas docentes, assim como eu, cercados por alunos que diante de uma reprovação, reagem sem pudor algum, sendo capazes de pedir que suas avaliações sejam desconsideradas e que sejam aprovados sob o frágil argumento de que não podem ser reprovados, desfiando um rosário imenso de desculpas demonstrando serem incapazes de assumir seus atos, terceirizando seus problemas aos seus mestres, mantendo-se na condição de crianças que esperam que um adulto lhes acolha em suas suplicas e resolva suas questões, pois não aceitam qualquer tipo de contrariedade.
Não muito distante disso, profissionais aparentemente maduros que comportam-se como crianças e mimadas diante de qualquer obstáculo.
Hoje algumas dessas pessoas ocupam cargos de gestão, totalmente despreparadas e sem resistência a dificuldades.
O que mantém essas pessoas nessas posições? O marketing pessoal.
Por quanto tempo ficarão nessas posições não se sabe, porém é fácil compreender que se não houver comprometimento, resiliência e perseverança, o profissional não se sustenta, porém, antes de saírem, podem fazer um estrago muito grande em suas equipes.
As grandes corporações e marcas somente atingiram visibilidade pelo trabalho longo e diário de profissionais comprometidos e se solidificaram com idéias novas, com o misto de novo e convencional, não sendo possível manter-se no mercado sem a combinação entre essas bases.
O contraponto para a manutenção da satisfação pessoal e corporativa está entre a consciência que nem tudo que já foi feito é obsoleto, os alicerces são importantes em toda estrutura, porém novos desafios servem para sair da zona de conforto, devem estimular a vontade de superação, não devendo dar margem para desculpas visando abandonar desafios, pois como já dito inicialmente pelo texto do Drº Dráuzio Varella, se tivermos todas necessidades satisfeitas tenderemos a deitar e ficar quietos, e isso definitivamente não combina com evolução.
Supere-se, ninguém fará isso por você, mas respeite os que já transitaram pela mesma estrada e fizeram de outra forma.